4.6.06

Veto Presidencial

- Pelos vistos há quotas boas (desejáveis, legítimas, instrumentos cruciais da democracia representativa que, como é óbvio, não são sujeitas a veto presidencial) e quotas más (que constituem "uma severa restrição à liberdade e ao pluralismo de opções que inerem à democracia representativa", segundo o Presidente da República)... Mas quais são umas e quais são outras?

«Cavaco não veta as quotas do Porto
Cavaco Silva devolveu o diploma sobre a paridade à Assembleia da República. Parece que, segundo o PR, não estamos preparados e parece que - também segundo o PR - é desprestigiante ("inadmissível estatuto de menoridade", segundo o PR) para as mulheres.
Como se hoje, em Portugal e em quase todo o mundo, os partidos políticos e uma data de órgãos do "sistema", não funcionassem já por quotas. As mais sagradas sao as geográficas. Não me lembro de qualquer elemento da famosa "quota do Porto" se ter insurgido por ser nomeado através da "quota do Porto" ou considerar isso um "inadmissível estatuto de menoridade". Parece que até é motivo de orgulho. Parece que é uma quota legítima. O Porto, bolas, o Porto tem que ter os seus direitos. Os órgãos representativos precisam de representar todo o país. Tem que haver ministros do Porto, secretários de Estado do Porto, membros da Comissão Política do Porto, membros do gabinete de estudos do Porto, membros da Comissão Nacional do Porto, membros da Comissão de Honra da Candidatura do Porto e por aí fora. E dentro do Porto, é preciso atender às justas reivindicações dos cidadãos de Matosinhos, uma subdivisão da quota, que também tem direito a ser legitimamente representada. Todos os partidos funcionam assim em nome do princípio da representação territorial dos cidadãos. Depois há as outras quotas: as juventudes, os sindicalistas, a tendência A, a tendência B, os operários e os intelectuais. Parece que, desde que seja entre homens, a coisa funciona.»

Ana Sá Lopes, Diário de Notícias, 03/06/2006

- Pelos vistos, o Presidente da República não está familiarizado com os dados demográficos publicados pelo Instituto Nacional de Estatística. De acordo com o PR, a Lei da Paridade vem "dificultar, desnecessariamente, a constituição de listas nas eleições locais onde, em certas áreas menos povoadas do interior e com elevado índice de envelhecimento (...), se torna problemático recrutar candidatos dentro dos estritos limites da representação de género impostos pelo diploma".
Para sua informação, reproduzimos aqui os dados relativos à percentagem de homens na população total residente de cada distrito de Portugal Continental em Dezembro de 1998*.

Aveiro: 48,6%
Beja: 49,2%
Braga: 48,7%
Bragança: 49,3%
Castelo Branco: 48,1%
Coimbra: 47,6%
Évora: 48,4%
Faro: 48,8%
Guarda: 47,8%
Leiria: 48,6%
Lisboa: 47,4%
Portalegre: 48,1%
Porto: 48,3%
Santarém: 48,2%
Setúbal: 48,5%
Viana do Castelo: 46,6%
Vila Real: 49,2%
Viseu: 48,7%

Considerando que em Viana do Castelo, por exemplo, 53,4% da população residente é composta por mulheres, é bem natural que o PR se preocupe com as dificuldades em encontrar, em zonas como esta, mulheres para integrar listas eleitorais... É que com tão poucas mulheres por onde escolher, o que será da democracia representativa nestes locais?!

* Gostaríamos de apresentar dados mais actuais, mas a página do INE tem estado "em baixo" todo o fim de semana e não permite o acesso aos resultados do Censo de 2001 ou a outras estatísticas demográficas mais recentes.
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8 comentários:

Susana Bês disse...

Estes dados são muito interessantes; cruzados com os que reflectem a composição dos grupos parlamentares (estão disponíveis no site da Assembleia da República, de onde os consultei para um post sobre o assunto) tornam a explicação do veto ainda mais inaceitável.

Taxista Feminista disse...

Cara Susana,

Seguindo a tua sugestão, visitei o teu blog e li o post que escreveste sobre o veto presidencial. Achei muito interessante a tua análise da representação das mulheres nos vários grupos parlamentares e tomo a liberdade de reproduzir parte do post em baixo - espero que não leves a mal.
Recomendo que visitem o blog da Susana Bês, Lida Insana e que leiam o post na íntegra.

"O BE (4 deputados e 4 deputadas) e os Verdes (1 deputado e 1 deputada) praticam já uma lei da paridade propriamente dita. São pequenos partidos, são forças periféricas, não é muito expressivo, poderá dizer-se.
Passando ao PS, verifica-se que pratica já uma remediada lei dos dois terços e picos (74 deputados e 47 deputadas). Para esta força partidária, os mínimos já estariam sendo cumpridos; viesse a lei nova, calamidade nenhuma.
No entanto, o mesmo não acontece com os restantes grupos partidários:
O PCP, enfileirando-se actualmente segundo uma lei do sexto (10 deputados e 2 deputadas), teria de dar uma volta pelas militâncias e prebendas.
Finalmente, muito, muitíssimo, imensamente inconveniente, seria a lei do terço para o PSD, que parece preferir a lei do undécimo-vírgula-qualquer-coisa (69 deputados e 6 deputadas), e para o CDS-PP, que se contenta com uma sólida lei dos duodécimos (11 deputados e 1 deputada).
Tendo em consideração estes números, a afirmação de que a lei da paridade mereceu o veto porque poderia ser prejudicial para certos partidos ou listas de candidaturas eleitorais é, no mínimo, infeliz. E ou foi feita com desconhecimento da realidade, o que estará muito mal, ou é excessivamente realista, o que é pior ainda."

Excerto de post de Susana Bês em Lida Insana

Anónimo disse...

Que eu saiba, não há quotas regionais ou outras impostas por lei aos partidos. Estamos a comparar coisas diferentes e isso é desonesto.
Não pensem que os partidos, até por conveniência eleitoral, não se esforçam por incluir mulheres nas listas, tal como jovens, ou licenciados, por aí fora.
Querer resolver a fraca presença feminina na Assembleia da Republica por decreto é preguiçoso, não trata dos motivos porque as mulheres não estão lá. Só pode trazer efeitos perversos, para não falar do insulto que é.

Anónimo disse...

teremos então que discutir onde deve fazer-se força e quem deve fazê-la

Anónimo disse...

1º, tnks lida, pelo sangue frio. bem que eu precisava para fazer melhor trabalho. só assim é possivel a análise.
2º, importante é o governo. importante é (para mim antes disso) tomar as rédeas do corpo e do desejo. parabéns pelos posts dos piropos, errar, errar cada vez melhor.
3º, há muitos cantos da sociedade civil despovoados. pouquissimo associativismo. português preocupa-se em 2006 com o espaço mediatico e pouco com a presença factual. go, voluntariem-se, façam parte. se são algo céptic@s ou radicais vão á mesma."isto" anda realmente mais com os encontros que com as opiniões.

eheh, may the force be with you

Anónimo disse...

we are the people's front of judeia!!!!

Anónimo disse...

Suas ignorantes,

Imaginem um partido como o CDS:

1) Não quer mais mulheres nas suas listas.

2) Os eleitores do CDS não querem que as listas tenham mais mulheres.

3) As mulheres do CDS não querem integrar mais as listas, como também não querem o aborto.

Agora expliquem-me porque raio o CDS tem de ser obrigado a incluir mais mulheres nas suas listas? Que raio de estupidez.

Anónimo disse...

Duas citações:

- "Só haverá igualdade no poder no dia em que houver mulheres incompetentes na chefia." (Maria de Lourdes Pintassilgo

- "Uma mulher no poder é como a Ginger ROgers: tem de fazer os mesmos passos do Fred Astaire mas às arrecuas e de saltos altos..." (Rosemary Speirs, presidente do grupo de acção canadiano Equal Voice)

E um facto:

- As novas Constituições do Iraque e do Afeganistão obrigam a umapresença feminina de 25% nos respectivos Parlamentos.