O "Prós e Contras" desta noite em teoria iria discutir a pergunta que irá constar no próximo referendo, ou seja, "Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras 10 semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?"
Tudo foi discutido menos isto. Pelo lado do Não teimava-se em se falar de liberalização do aborto. Insistem em não perceber a diferença entre despenalização e liberalização, apesar da Ariel já ter explicado isso muito bem.
Do lado do Sim, diga-se, que a escolha também não foi das melhores, Edite Estrela, pelo PS, e na plateia uma apagada e atrapalhada Natacha Amaro do Movimento Democrático de Mulheres, em nome do Movimento pela Despenalização da IVG. Salvou-se o médico pelo lado do Sim, Miguel Oliveira da Silva, que fez muito mais frente ao movimento anti-escolha que a representante do Governo.
Fátima Campos Ferreira mais uma vez mostrou que não sabe moderar nada, e deixou os convidados a falarem de alhos e bugalhos.
O médico pelo Não, João Paulo Malta parecia uma cassete riscada, sempre a começar as suas intervenções com “aqui ainda não se discutiu o cerne da questão que é a liberalização do aborto”. Já percebemos que o movimento do Não encrava nos seus chavões, e repete-os até à exaustão para ver se a coisa fica no ouvido. O movimento do Não não está interessado em realmente discutir a questão e mostra como é coerente no seu elitismo patente a não esclarecer nada, porque segue aquela filosofia de escola primária como quando nos ensinavam a tabuada ou a conjugação dos verbos, portanto, cantilenas que deviam ser repetidas, e fixadas, até à exaustão, sem interrupções, sem questionar.
O mesmo aconteceu a Isilda Pegado, antiga deputada do PSD, que estava na plateia, do lado do Não, enquanto jurista. De jurista mostrou pouco entregando-se a um discurso histérico e sem sentido, a falar dos bebés e sem capacidade de resposta quando confrontada com questões concretas. O seu momento mais embaraçante foi nem sequer conseguir reconhecer em público que nem nos casos de violação admite o aborto, quando anteriormente afirmou que o aborto não deveria ser considerado de maneira nenhuma, porque está ali uma vida. É triste quando as pessoas nem sequer conseguem admitir as suas próprias ideias.
O momento alto da noite, por ser tão mau, prendeu-se à prestação de Zita Seabra. Entre as várias pérolas também repetidas até à exaustão, mas com muitas contradições (ela ainda não fixou bem as cantilenas), começou por dizer que em 84 fazia sentido uma lei sobre o aborto, porque não havia planeamento familiar e não existia informação sobre os métodos contraceptivos. Segundo Zita hoje em dia essa questão já não se coloca, só engravida quem quer. E fala da pílula do dia seguinte, e mais tarde, já começa a dizer que a pílula do dia seguinte não é assim tão segura, para mais tarde, voltar a dizer, que a pílula do dia seguinte vende-se em qualquer farmácia, por 3€50. Quando começa a ver que esse, talvez, não fosse o melhor caminho argumentativo, ainda se lembra de dizer que ficou chocada quando Odete Santos falou das mulheres que recorrem às agulhas de crochet, em vãos de escada, quando “hoje ninguém sabe o que é uma agulha de crochet”. Mais, “que o nosso país tem uma baixíssima taxa de natalidade” e por isso também não faz sentido falar de aborto.
Foi nesta altura que Edite Estela teve alguns rasgos iluministas, mas também diga-se, era bem fácil, face aos disparates que Zita Seabra estava a dizer. Mas no geral a sua prestação foi fraca, com algumas trapalhadas no seu discurso, e foi evidente que ficou sem resposta quando questionada se as mulheres continuarão a ser levadas a julgamento e para a cadeia se abortarem depois das 10 semanas.
Em suma, o debate foi trapalhão e mais uma vez, tudo se resume à apresentadora do programa, que apesar, de não estar nos seus dias piores, manteve os tiques do costume, a pose corporal que diz tanto, e a sua fraca capacidade de moderar um debate. Ficou claro que movimento anti-escolha vai continuar a pregar o argumento da vida do bebé, que vai falar sempre em crime e em liberalização do aborto, que nos países onde o aborto foi legalizado o número de abortos aumentou, e no que parece que fixou para ficar, insistir na cantilena “se a minha mãe tivesse abortado eu não existia”, por isso, não me espanta que dentro de bem pouco tempo, se comece a ver cartazes e t-shirts com ecografias estampadas.
Do lado pela escolha, o lado do Sim, percebeu-se que o Governo vai insistir que lei que existe é insuficiente, que as mulheres não podem ser mais penalizadas, nem julgadas. O que não pode fazer é pôr deputadas com a Edite Estrela a elucidar @s eventuais indecis@s. E também não teria sido má ideia ter apelado ao voto no próximo referendo, porque se realmente querem acabar com esta tirania, não se podem a arriscar a ter níveis elevados de abstenção, porque essa, sim, essa é a pior das inimigas. Por fim, e um reparo, seria bom o Governo pensar se mesmo depois das 10 semanas, vai continuar a levar mulheres a Tribunal.
1 comentário:
Sara disse...
"... não me espanta que dentro de bem pouco tempo, se comece a ver cartazes e t-shirts com ecografias estampadas."
Sim, para compensar os "Eu Abortei!" e os "Aqui mando eu!", tão bem retratados em O Aborto de Joa Cartoons - http://joacartoons.no.sapo.pt , não achas?
31/10/06 13:42
Barriguita disse...
Não, não acho. O recurso a uma imagem não tem que, necessariamente, recorrer ao choradinho fácil, que é o que faz o PNR con os seus cartazes da criancinha angelical, com um ar ariano, a dizer "se a minha mãe tivesse abortado eu não existia". Mais, o recurso de ecografias é só mesmo para se focarem no argumento da vida, para chocar as pessoas e evitarem discutir que a despenalização do aborto é uma questão de escolha e de direitos sexuais e reprodutivos, e que as mulheres- sempre e só as mulheres - é que são penalizadas por isso. Portanto, não, não é a mesma coisa.
31/10/06 13:58
Barriguita disse...
Aliás é o movimento anti-escolha que opta sempre recorrer a imagens desse género. Houve ontem dois momentos bem ilustrativos da sua intenção de chocar: o Gentil Martins a levar o seu diploma de curso e a rapariga com Trissomia 21 a agradecer à mãe por lhe ter dado à vida. Isto sim, é manipulação pura e dura.
31/10/06 14:10
Anónimo disse...
é verdade, muitos disparates foram escritos por aqui!!
"manipulação pura e dura?!"
a verdade é dura e choca, magoa e fere...
25/1/07 16:45
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